22 September 2008

Meu cabelo não amassa mais quando eu acordo. Eu levanto, com gosto de guarda-chuva no céu da boca ainda, e ele escorre, fininho, esquisito, pra minha orelha. A cabeleireira rasgou uma navalha fácil para umas pontas quase sem graça. Elas ficam me olhando agora no espelho, arrebitando pra ver se eu dou bola pra essa cara diferente, esse cabelo escorrido. É o progresso da televisão; progressiva fede. Eu não disse que eu to feia, muito pelo contrário, depilo o buço e faço a unha da mão toda semana; o pêlo da cara é cruel no vídeo. Televisão ainda não tem cheiro, que bom, porquê eu lavo as roupas pela madrugada e elas não aceitam mais, tão bem, 10 horas de varal sem amaciante. O lençol nem carece mais de ser fresquinho, nem durmo mais de conchinha. Homem só os 110 que entram terça, quinta e sábado na programação. A dor que o corno deixou é da dor de quem se transforma. O médico vem de mansinho, abre a porta da minha geladeira; entra no meu quarto, brinca com minhas músicas e deixa a casa arreganhada para o mostro, que de álcool e ácido, vem querendo, no repente, me bater. Não aconteceu nada, mais eu fiquei atônita e gelada, feito meu cabelo novo sem graça.

.Sinto saudades novas